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A mostrar mensagens de 2008

BOM NATAL

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Colho da versatilidade inteligente do padre Maia a matéria–prima para um esboço de mensagem de Natal. A adaptação da palavra evangélica aos tempos modernos foi partilhada num programa de rádio e provocou as mais vibrantes reacções. Maria e José foram tratados em Belém como imigrantes ilegais. O menino Jesus foi um sem-abrigo, tendo que nascer na mangedoura dum estábulo. Filho de mãe solteira. Barbaramente assassinado aos 33 anos de idade. E quanta gente, no mundo inteiro, continua a acreditar que está vivo! Em 2008 há ainda tanta gente a passar pelo mesmo… Bom Natal!

O Trombone motard

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Fotografia - Estela Silva O apelo para mais um concerto da Casa da Música surgiu pela banda da excentricidade. Talvez para captar a ignorante e desatenta atenção dos media, a cenoura exibida pela promoção do espectáculo era a interpretação de Christian Lindeberg da Motorbike Odyssey , de Jan Sandstrom, para trombone e orquestra (versão curta). O génio do trombone, semelhante em virtuosismo a Paganini no violino e a Liszt no piano, ia imitar o ruido dos motores das motos a passear nas paisagens naturais e urbanas. A interpretação era incluida num parêntesis de Grieg e, a fechar parêntesis, Beethoven, num desempenho da Orquestra Nacional do Porto. Na aflição de que não houvesse orgão de comunicação social que noticiasse o concerto, a promoção deixava a dica de que até os motards iam aparecer à noite clássica. Fiquei à espera de ver entrar os motoqueiros encavalitados nas potentes máquinas na altura da Motorbike Odyssey . Não apareceram e também não fizeram falta. Lindeberg, que para a o

Balada da neve

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Serra de Montemuro, aldeia de Aveloso A neve desperta em mim nostalgias dos tempos de criança. Por isso, não resisti a um regresso às origens. Geografia de agruras, tempos de felicidades. A neve era acontecimento regular. Brincadeira no recreio. Trabalho forçado nas aulas. "Batem leve, levemente/como quem chama por mim..." O poema de Augusto Gil era a matemática da língua e ai de quem não o soubesse soletrar. Ficou o poema e sempre que a neve cai, a memória estende-lhe os lençóis das lembranças... Batem leve, levemente, como quem chama por mim. Será chuva? Será gente? Gente não é, certamente e a chuva não bate assim. É talvez a ventania: mas há pouco, há poucochinho, nem uma agulha bulia na quieta melancolia dos pinheiros do caminho... Quem bate, assim, levemente, com tão estranha leveza, que mal se ouve, mal se sente? Não é chuva, nem é gente, nem é vento com certeza. Fui ver. A neve caía do azul cinzento do céu, branca e leve, branca e fria... - Há quanto tempo a não via!

Descalço…sim, mas na praia!

Regresso de novo ao sr. Santos. O ouvinte do programa de rádio tem uma memória e uma experiência de vida que fazem lembrar aqueles baús à guarda de velhos sótãos. Resistentes, fascinantes, sedutoras e recheadas de histórias que serve com deleite, extasiado e irónico. Falava-se de Educação no país mas o sr. Santos encontra sempre espaço para dar a volta à marcha da conversa. Logo na primeira curva da sua intervenção telefónica falou do caso BPN. O antigo administrador do banco, Oliveira e Costa, estava a prestar declarações no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa sobre as alegadas burlas, fraudes e branqueamentos de capital, que terá dado origem à derrocada da instituição bancária, quando o sr. Santos resolveu oferecer ao auditório mais um achado do tal baú. - Conheci esse senhor ( José Oliveira e Costa) em tempos numa assembleia-geral. Nessa ocasião, para tentar sensibilizar a plateia, o homem utilizou a seguinte expressão: “Eu não me envergonho de dizer que cheguei a andar descal

A primeira vez de Lisa Ekdahl em Portugal

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Se eu tivesse muito dinheiro contrataria a sueca Lisa Ekdahl para me adormecer nas noites mais difíceis. Não adormecia, que aquela voz que lhe sai da alma possui-nos inteiros, mas aproveitava o tempo. Como não tenho posses para tamanha extravagância vi-me na contingência de aceitar uma oferta do último bilhete, na última fila da grande sala Suggia da Casa da Música, no Porto. À minha frente mais de mil silhuetas separavam-me da campesina que entrou em palco, vestido às florinhas, chapéu de donzela, botas de jardim elegante. Disse “obrigada” e agradeceu ao público a comparência em massa na primeira vez que vem a Portugal. E cantou. Os temas do costume e alguns originais a incluir no próximo álbum. Dedicou um desses temas, “One Life”, ao novo presidente dos Estados Unidos. E cantou com aquela voz que se entranha como uma obsessão. Na descoberta do seu próprio caminho, à medida que acumula versões dos temas clássicos do jazz, vai despindo a banda de sonoridades típicas do jazz. Da bateria

Fugiu-lhe a boca para a verdade!

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Cito o texto da Agência Lusa para tecer este comentário. «A presidente do PSD, Manuela Ferreira Leite, perguntou hoje se "não é bom haver seis meses sem democracia" para "pôr tudo na ordem", a propósito da reforma do sistema de justiça.» Para alguém que, na política, descobriu o silêncio como suporte de comportamento, para realçar as intervenções de fundo que entende fazer este é um deslize fatal. O sábio povo costuma dizer perante tais ocorrências: “fugiu-lhe a boca para a verdade!” Ao mesmo povo é consentida a ideia indignada de que na ditadura havia mais segurança e que o país está a precisar de um novo Salazar. É até admissível pensar que a líder da oposição, sendo de direita, apreciará a imposição das reformas mesmo contra a vontade das classes profissionais e dos interesses específicos. Só não se compreende como foi possível Manuela Ferreira Leite ter desabafado tais tendências numa daquelas raras ocasiões em que a presidente do PSD decide falar para o país. É

Rir uns dos outros

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Há uma estranha relação entre as pequenas figuras asiáticas e as pessoas que deambulam por entre a instalação de esculturas na grande sala do Museu de Serralves. Inquietam de uma forma humana. Interpelam e parecem estar vivas. Fica a sensação de que quando se desvia o olhar elas se movem dissimuladamente. Dá vontade de ficar por ali a ouvir as conversas, aceitando o convite implícito nos sorrisos dinâmicos e nas poses amigáveis. A retrospectiva que Serralves consagrou ao artista espanhol Juan Muñoz é digna de visita prolongada. A interacção é real. Juan Muñoz morreu aos 48 anos, inesperadamente de uma hemorragia no estômago, a 28 de Agosto de 2001. Ao Porto deixou uma obra que pode ser vista no Jardim da Cordoaria – Treze a rir uns dos outros -, no âmbito da Porto 2001.

Porque não te calas, Sócrates?!!!

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Razão parece ter a oposição que vem avisando para os excessos de marketing político de que padece o governo liderado por José Sócrates. Desde vendedor de ilusões a propagandista, passando até por mentiroso, os partidos à esquerda e à direita do PS já por diversas vezes mimosearam o primeiro-ministro por causa do que consideram ser a exorbitante capacidade de anunciar actos e intenções do seu executivo. É certo que as alcunhas de vendedor de banha da cobra acabam sempre por assentar em quem está no poder, toma decisões ou promete tomar. Mas raramente o próprio as aceita como elogios à acção governativa. Ora, José Sócrates quebrou essa tradição. Embora refutando os créditos de bom publicitário a nível interno, o chefe do governo encetou uma carreira comercial internacional que o pode levar a ser convidado por uma das grandes multinacionais quando sair do governo, não tendo que aceitar um cargo na administração de alguma das maiores empresas caseiras, depósito inevitável para antigos gove

Ney Matogrosso igual a si próprio

Ajudei a encher por completo o Coliseu do Porto a pretexto de mais um concerto de Ney Matogrosso, desta feita para apresentação do novo álbum-espectáculo “Inclassificáveis”. Para além da voz potente e dúctil que empresta às canções uma originalidade inimitável, razão mais do que suficiente, o que gosto em Ney é a genuína extravagância. O cantor brasileiro transporta para o palco todas as suas fantasias, de todas as naturezas, e partilha-as com os públicos heterogéneos que não lhe poupam aplausos. No “Inclassificáveis” ele é o que sempre foi: carnavalesco, ritualístico, tribalístico, sensual e provocatório, Ney Matogrosso faz pouco da idade e goza com as convenções e os preconceitos. Espampanante nos milhares de lantejoulas, nos penachos de pavão, nas toucas totémicas, nas saias de fiapos de contas, na roupa interior feminina, nos gestos fálicos e trejeitos lascivos, Ney demonstra um profissionalismo inatacável e couraçado que resiste, incólume, da mesma maneira, às imagens que lhe cola

Crises...

O sr. Santos é um ouvinte assíduo do programa de rádio que costumo ajudar a fazer às sextas de manhã, emitido na região do Grande Porto. Não conheço do sr. Santos mais do que a voz, a condição de reformado e o que as opiniões que partilha nas emissões em directo me consentem intuir. No último programa o tema principal era a crise financeira mundial, mas o sr. Santos fez um desvio para abordar o tema que a actualidade tinha trazido à tona: o casamento entre homossexuais. Já nos habituámos ao pensamento conservador e sustentado na corda bamba entre valores de direita e esquerda, convertido em ondas hertzianas de forma crítica e provocatória. Mesmo assim, não raras vezes, deixa-nos embasbacados com a graça cáustica com que embrulha os comentários: - Eu, os homossexuais compreendo e aceito. Andei na tropa em África e por lá apareciam alguns rapazes que nos contavam que em crianças tinham sido abusados sexualmente. Esses eu entendo. O que não consigo compreender são os paneleiros... Depois

Vende-se

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Quando a curiosidade perguntava a razão para tamanho despudor a resposta recaía sempre na loucura saudável dos residentes artísticos daquela casa na zona da Ribeira no Porto. Mas agora o anúncio de venda interpela aquele suicídio sensual e, de repente, transformou a varanda numa arrojada promoção de casa de alterne de luxo ou coisa do género. É muito provável que, apesar da crise, a Susana Ribeiro, vendedora da Remax, receba por estes dias algumas propostas...

O Canto da Cultura

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A hora do almoço já estava a invadir os territórios da tarde. O apetite ameaçava transformar-se em necessidade física. Em Fafe, os restaurantes ou estavam de férias, de folga ou escondidos. Servia qualquer um. Num primeiro andar esconso vislumbrou-se a salvação num mostruário de pessoas sentadas à mesa denunciando a casa de pasto: o Canto da Cultura, lia-se com dificuldade no toldo recolhido. À entrada da escadaria a confirmação em forma de escaparate publicitário de lousa indicava o caminho. O medo da congestão provável foi mais forte que a fome...

Aquele querido mês de Agosto

Há muito tempo que não ia ao cinema sozinho. A chuva do fim de tarde alertava para a partida do verão, memória a que o título aludia, mas também avisava para a enchente do centro comercial Arrábida, onde a película ainda estava em exibição: “Aquele querido mês de Agosto”, do realizador português Miguel Gomes. Na sala estavam cinco pessoas. Mau presságio para um filme que me tinham recomendado como uma curiosidade cinematográfica. Se tivesse percebido que o filme durava 150 minutos, (duas horas e meia!!!) provavelmente teria desistido. Mesmo sabendo que, em termos de gosto, um filme é como um livro ou como um vinho, cada um aprecia à sua maneira, devo dizer que fiquei saciado. Há muito tempo que não me divertia tanto com a mistura complexa da simplicidade genuína que é o Portugal interior, captado na mais apurada essência, por uma equipa de realização que transpôs para a tela a sua própria dificuldade em levar o guião por diante. Até agora não sei se foi propositado ou não. O filme é, n

Combustíveis

O anódino ministro da economia, Manuel Pinho, expressando-se na SIC Notícias sobre o facto dos preços dos combustíveis não acompanharem a descida do preço do petróleo nos mercados internacionais, tal como acompanharam a subida, garantiu aos cidadãos e contribuintes em geral e aos condutores em particular: - Vão descer. - Vai tu! Responderam em uníssono os preços do gasóleo e da gasolina...

Montanha russa

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A montanha russa é uma das melhores metáforas da vida. O clímax coincide com o momento em que estamos virados do avesso. A viagem dura pouco e, no final, dá vontade de comprar outro bilhete. A diferença é que, na vida, cada um vai alterando a configuração dos altos e baixos.

Vrummmmmmm

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Às primeiras passagens, na improvisada pista entre pontes, em ziguezagues trovejantes, rentes ao Rio Douro, a impressão que causam os besouros gigantes com fogo no rabo, chega a ser magnética. Às segundas passagens, causa assombro o malabarismo aéreo dos pilotos, desenhando figuras na tela azul do céu depois de quase pincelarem as asas dos aparelhos nas águas indiferentes. Às terceiras passagens estranha-se o mar de gente que desagua nas margens do rio - 650 mil pessoas, este ano - para ver uma dúzia de aviões a copiar manobras, roncando por uns centésimos de segundos. Às quartas passagens já se sente o peso dos intervalos em que o silêncio se torna quase insuportável e do céu não descem mais do que raios de sol. Às quintas passagens vocifera-se com os infelizes que tiveram a ideia de cortar o trânsito em meia cidade do Porto por causa da Red Bull Air Race ou o raio que os parta... Às sextas... Vamos embora! Porra! Isto é sempre igual...

Nem oito nem oitenta

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Somos um país de oito ou oitenta. E pior que isso: passámos de um estado ao outro enquanto o diabo esfrega um olho. Para reforçar esta constatação, provavelmente preconceituosa, recorro a mais um recente exemplo: os Jogos Olímpicos de Pequim. Com um orçamento de 14 milhões de euros, Portugal levou à China 77 atletas e objectivos de alcançar 4 /5 medalhas e 60 pontos. Conseguiu duas e alcançou 28 pontos. A meio dos jogos, quando ainda não tinha conquistado medalha nenhuma, o Presidente do Comité Olímpico, Vicente de Moura, anunciou que não se candidataria a mais nenhum mandato, como forma de protesto contra a desmotivante participação lusa. Entretanto, Vanessa Fernandes conquistou a prata no triatlo e três dias depois Nelson Évora voou 17,67m, no triplo salto, descobrindo o ouro. Da enorme desilusão passou-se, de imediato, à euforia. Vicente de Moura, num despudorado golpe de rins, recua na intenção de se afastar do COI e começa logo a pedir ao governo reforço financeiro para a próxima

Férias

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Beberibe, Brasil Férias são intervalos, ilhas, interrupções, quebras, parêntesis, pausas, oásis, silêncios, descontracções, desleixos, buracos, descansos, aventuras, deslumbramentos, sonhos... Férias... é adormecer com o sussurro e acordar com o rugido do mar; comer frutos tropicais e banhar-se numa praia deserta; secar e voltar às águas quentes e temperadas as vezes que apetecer; não fazer nada e não ter problemas de consciência. Férias... é nada fazer até ao cansaço.

Abaixo o Aleixo!

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Com o intuito de realizar uma reportagem pude visitar a torre 1 do bairro do Aleixo, no Porto, onde funciona, todos os dias, um dos mais conhecidos mercados de droga da cidade. O que vi é indizível. À entrada deambulam mortos-vivos arrastando-se na urgência do consumo, misturados com pregões dos intermediários e vigias do negócio dos estupefacientes, residentes e clientes que chegam e partem em veículos próprios e táxis. O rés-do-chão é um ninho de ratos humanos atarefados nas operações do comércio e do consumo de droga. O local é escuro e atemoriza. As figuras humanas parecem pertencer a um filme de terror. O movimento é caoticamente organizado por rituais, gritos, gestos, códigos e sinais. A violência lateja. A anuência invisível dos traficantes permite que veja mas faz-me sentir a mais. Saio com a convicção de ter feito uma visita ao inferno. Aleixo é nome maldito. As restantes quatro torres pagam a factura da má fama. Há, crianças a brincar, velhos sentados nos bancos de pedra e mu

Pour la Musique. Merci.

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Milhares de turistas enxameiam junto da Basílica do Sacré Coeur, em Montmartre, numa azáfama sôfrega para tudo ver e visitar. Querem respirar o ar que foi exalado, naquele mesmo local, por Degas, Cézanne, Monet, Van Gogh, Renoir, Toulouse-Lautrec e outros pintores agora famosos. Os candidatos a artistas boémios deambulam pela enxurrada de turistas à espera de ouvirem o tilintar metálico das moedas no fundo do chapéu. A arte da sobrevivência é, nos tempos que correm, a grande arte daquele bairro parisiense.

Amo-te Paris

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Auguste Rodin e Gustave Eiffel, ambos ambicionaram conquistar o céu. E se não o conseguiram pelo menos fizeram-no ficar mais perto. Paris é a cidade conhecida pelo amor que permite sonhar com impossíveis. Amo-te Paris.

Mais ou menos, nem muito nem pouco, assim-assim

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Desde 1981 a World Values Survey e a Universidade de Michigan, instituições presumivelmente idóneas e credíveis, dedicam-se a fazer um estudo subjectivo sobre a felicidade de quase uma centena de países por esse mundo fora. A subjectividade resulta da noção de felicidade e do método utilizado: um inquérito em que, numa escala de zero a dez, cada um tem que avaliar se é muitíssimo, muito, pouco, ou nada feliz. Os resultados não revelam nada de extraordinário. Em 97 países Portugal está um pouco acima do meio da tabela, com uma pontuação de 5,5. Nem felizes, nem infelizes, antes pelo contrário. A Dinamarca é o campeão da felicidade, com 8 pontos, seguida pela Islândia, Suiça, Holanda e Canadá. No fim da tabela surge o Zimbabwe, porque o regime de Robert Mugabe não se apercebeu dos trabalhos de recolha de dados… Mais interessante, mas ainda assim pouco surpreendente, é a convicção com que os investigadores ficaram, ao longo destes anos todos a medir a felicidade dos países, de que os cida
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Para bem ou para mal, o Museu do Louvre está transformado em centro comercial de arte. Paga-se nove euros de entrada e pode deambular-se pelas infindáveis salas, de obra-de-arte em obra-de-arte, como borboleta em campos de girassóis. Impressiona o espólio do Museu e impressiona o mar de gente que, todos os dias, invade o Louvre de máquina fotográfica ou telemóvel em punho. A maior parte só lá vai para poder dizer que lá esteve e que viu a Mona Lisa de Leonardo da Vinci e a Vénus de Milo. O mais curioso é a adopção de estratégias de centro comerciais corriqueiras. Dando vazão à ânsia dos turistas, a administração do Louvre mandou colocar pelas esquinas dos corredores e escadarias umas fotocópias a preto e branco, com uma setas destacadas, a indicar a localização das duas obras mais famosas do mundo. E quando se chega à enorme sala onde está aprisionada a ambígua Gioconda é chocante o espectáculo da multidão pressurosa e impaciente, procurando a maior proximidade do quadro, como se fosse
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Podia dizer, para quem não sabe, que o S. João é uma festa popular feita de bailaricos, balões de papel nos céus da cidade, alhos-porros e martelinhos nas cabeças uns dos outros em jeito de cumprimento, cheiro a manjerico, sardinha assada, fogo-de-artifício sobre o rio Douro. Mas não é. Quem sabe o que é a festa do S. João sabe que é um abraço gigante onde cabem os do Porto e os de fora. Por uma noite somos todos iguais.

Formosa e segura

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A Ponte da Arrábida foi inaugurada no dia 22 de Junho de 1963. Era o maior arco abatido em betão armado da Europa. Motivo de orgulho do Porto e obra do polémico e genial engenheiro Edgar Cardoso. No dia da inauguração foram muitos aqueles que ficaram à espera de a ver cair. Já lá vão 45 anos e, actualmente, passam diariamente na ponte da Arrábida 125 mil viaturas. Continua segura e formosa unindo as costas de duas cidades. Quantas mais pontes serão precisas para que Porto e Gaia se virem de frente?

"E o burro sou eu?"

Tal como eu previ, mal começou o Euro 2008 a sério Portugal perdeu. 3-2 com a Alemanha. No momento em que escrevo não consigo afastar a frase que desde o final do jogo ensarilha as ideias: "E o burro sou eu?" A frase com que Scolari tentava demonstrar aos críticos os seus acertos futebolísticos. Agora é fácil dizer mal do seleccionador brasileiro. Só vou recordar três factos: Portugal perdeu duas vezes com a equipa da Grécia no Euro 2004; Portugal perdeu duas vezes com a Alemanha, no Mundial de 2006 e agora no Euro 2008; Portugal sofreu dois golos no mesmo jogo exactamente da mesma maneira. Conclusão: Scolari não aprende com os erros. A mesma interrogação do treinador brasileiro volta a pressionar-me para aparecer de novo no texto ... Não, não vou criticar o "Sargentão" de quem não gosto há cinco anos e meio. Vou optar por fazer mais uma previsão: Luiz Felipe Scolari vai treinar o Chelsea até ao Natal, altura em que regressa ao nosso país para ingressar no Benfica.

O meu pai

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O meu pai morreu, exactamente, há sete anos. Só tinha 64 anos e muito por viver… Tive com o meu pai uma relação de três décadas e meia marcada por períodos de solavancos afectivos. Em pequeno adorava senti-lo chegar a casa ao cabo de uns dias de ausência; apreciava a segurança discreta que dava à família; gostava do ambiente de conforto emocional com sabia que encher o lar. Após a conclusão da escola primária predominou entre nós uma ausência física, a saudade e a mágoa que se aprofundou durante cinco anos. Na adolescência medrou a revolta militante que cultivei até ao insuportável. Quando me transformei num adulto a relação evoluiu para uma troca intuitiva de sentimentais silêncios. Nunca lhe disse que gostava dele e tantas vezes mostrei-lhe o contrário. E nunca lhe disse que sabia que ele gostava de mim. O meu pai era um homem especial. Não por ser meu pai, mas por ser um homem bom. Desiludi-o uma data de vezes. Demais. A revolta da minha adolescência fez-lhe a vida negra. Era o meu

Portugal atingiu os mínimos

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Eu não gosto de Scolari. Gosto muito de Portugal. Por isso, fiquei contente com a notícia da saída do brasileiro para o Chelsea. E fiquei triste porque o anúncio extemporâneo pode abalar a confiança da família desportiva que está a jogar o Euro 2008. Confirmou-se a minha reserva em relação ao protegido de Nossa Senhora do Caravaggio. Não é bom treinador e acho que como chefe de família deixa também a desejar. Portugal atingiu os mínimos. Com aqueles jogadores e com aqueles adversários a equipa das quinas tinha a obrigação de fazer o que fez. Só escusava de ter perdido com a Suíça. A partir daqui tudo o que Portugal alcançar, por razões que já antes aduzi, será creditado na conta pessoal de Scolari. E com o agrupamento de jogos que nos calhou em sorte ir à final e vencê-la não é miragem nenhuma. Desconfio que não chegaremos tão longe. Por culpa de Scolari que deixou de ser seleccionador nacional para passar a ser treinador do Chelsea emprestado por alguns dias. Oxalá a família lhe acuda

Serralves em Festa

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Segundo as contas feitas por alto, foram mais de 80 mil as pessoas que estiveram em Serralves, no Porto, este fim-de-semana. O “Serralves em Festa” voltou a ter mais gente que as edições anteriores. É assim há cinco anos consecutivos. A ideia de João Fernandes, director artístico da Fundação, é um ovo de Colombo. Conseguiu transformar uma imagem de elitismo cultural numa experiência popular reconfortante e conseguida. A arte é para todos. Nada se perde, tudo se transforma. Durante 40 horas as portas abrem-se para quem quiser aproveitar uma programação artística multifacetada, plural, caleidoscópica, ininterrupta, que brota de todos os espaços da quinta. Um dos exemplos mais paradigmáticos desta magia de transformação artística foi o resultado da conjunção entre futebol em écran gigante, comentários ao vivo de Gabriel Alves e a música improvisada dos Space Ensemble inspirada na vitória de Portugal frente à Turquia no Euro 2008. Serralves começou por ser uma quinta com uma casa senhor
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A febre da selecção nacional de futebol voltou a afectar o país. O vírus é o mesmo de há seis anos a esta parte: Luiz Felipe Scolari. Sofreu umas mutações mas, por mim, já tinha sido erradicado. Não gosto do brasileiro que escolhe e treina os melhores futebolistas portugueses. Durante dois anos preparou a equipa para o Euro 2004, insistindo numa equipa que não tinha em conta o F.C. do Porto de José Mourinho que tudo ganhou. Depois da derrota inaugural com a Grécia, ressabiado, acabou por dar ouvidos a todos os treinadores do país e colocou a equipa de Mourinho a jogar: ia ganhando o campeonato da Europa. E com a mesma base aguentou-se razoavelmente no Mundial de 2006. Considero, de forma simplística, que o Felipão é um bom chefe de família, mas um mau treinador. Só assim se entende que leve para o seio do grupo não os melhores desportistas mas os mais bem comportados. Que apesar dos maus resultados nos jogos de preparação insista num discurso de arrogante desculpabilização. Considero q
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Somos distraídos por natureza. Mesmo que debaixo dos nossos olhos o sol desenhe arabescos no tampo da mesa metálica só os vemos quando a fotografia fortuita nos dá uma cotovelada. Só abarcamos o óbvio. Benditos os que vivem da arte e da poesia. São os que conseguem olhar directamente para o sol e não ficam cegos.

A menina nua da avenida

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"Menina nua" na Avenida dos Aliados. Escultura de Henrique Moreira, 1929. Estou apaixonado pela menina nua da avenida. Sempre que me vê sorri de forma diferente. Da última, fez-me lembrar a Mona Lisa num sorriso ambíguo e enigmático que me deixou à deriva. Já a senti maliciosa. E envergonhada. E divertida. E atrevida. E inocente. E efusiva até, de cachecol ao pescoço vestida pelas cores das vitórias dos clubes do Porto. Já a vi rir-se com desdém dos políticos vaiados pelas manifestações. E sei que atura com a boa disposição do costume os bêbedos e os sem-abrigo que passam a noite com ela. Não lhe conheço casos amorosos e quase podia jurar que goza com os comentários provocatórios arrulhados pelas pombas frequentemente pousadas nos ombros e na cabeça. Dizem que nas noites de lua cheia de cio, salta do plinto, lava-se na água dos mascarões e vai matar o desejo com os homens-estátuta dos prédios vizinhos, na Pensão Avenida, mesmo ali ao lado. Da última vez, roído de ciúme, pergu

Justiça divina

Já por várias vezes Ferreira Torres disse acreditar na justiça divina quando está a braços com a justiça terrena. A última sessão do julgamento do antigo presidente da Câmara de Marco de Canaveses foi disso exemplo. A meio da tarde, com os apaniguados a encheram a sala de audiências e o colectivo de juízes retirados para decidir sobre um requerimento, o ex-autarca socorreu-se frequentemente da expressão “por amor de Deus” para reverberar uma indignação de circunstância de que vos vou dar conta. O diligente funcionário judicial, ciente do poder que a placa do Ministério da Justiça pendurada na lapela do casaco lhe dá, não disfarçou o sotaque autoritário da Régua quando pediu o Bilhete de Identidade de uma senhora da assistência, suspeitando que a criatura pudesse ser testemunha do processo. Como uma mola, Ferreira Torres levantou-se do banco dos réus, despiu a condição de arguido - acusado de corrupção, extorsão, abuso de poder, peculato de uso - e armou-se em advogado de defesa da pobr

Quando o trabalho mata!

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O senhor Manuel mata-se a trabalhar. Nasceu em 1951 e hoje tem, portanto, 57 anos. Na altura em que o país se viu livre da ditadura ele livrou-se da tropa e retomou o seu emprego nos caminhos-de-ferro. Começou a trabalhar com 14 anos mas só aos 17 é que foi legalizado fazendo descontos para a Caixa de Previdência. Fica a dever à sorte e à competência o facto de nunca ter estado em situação de desemprego e à saúde apresenta a factura de raramente ter que justificar faltas ao patrão. Ao todo já trabalhou durante 40 anos. Cumpridor, exigente consigo próprio e com os outros o senhor Manuel anda cismático. Não consegue perceber o Estado que, à medida que ele se aproxima da idade de reforma, vai esticando o prazo. É uma viagem cujo destino fica mais longe por causa da alta velocidade desta vida, pensa ele, de cara quase encostada ao vidro do comboio todas as manhãs quando se desloca para as oficinas de manutenção da CP, onde é encarregado. A partir de 1993 a pensão era calculada sobre a médi
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Só por mera distracção não se repara nos pingos de vermelho puro que a terra sangra espontaneamente por esta altura nos campos de primavera. São papoilas, pequenas flores que cicatrizam imediatamente se forem colhidas. Dizem que vieram do Oriente com os cereais, que têm um poder narcótico e tendem a desaparecer com o uso de herbicidas que as tratam como se fossem ervas daninhas. Dizem que se tranformam em ópio. Deve ser por vingança...

O Pintor de Batalhas

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O livro O Pintor de Batalhas, de Arturo Pérez-Reverte é uma reflexão profunda sobre a tensão estética entre fotografia e a pintura. O livro é um triângulo de relações em desequilíbrio: Faulques – repórter fotográfico de muitas guerras – Ivo Markovich, soldado croata fotografado, capa de muitas revistas de informação no mundo inteiro - e Olvido Ferrara – antiga estudante de História da Arte, modelo fotográfico até “decidir passar para o outro lado da câmara”, morta por uma mina nos Balcãs. O livro é uma lição sobre o poder da imagem. O livro é uma história de amor entre dois colegas de profissão no meio da paixão da fotografia de guerras, em busca de si próprios. O livro é um tratado sobre a limitação da fotografia perante a perfeição da pintura. Constatação evidente quando Faulques e Olvido contemplaram o quadro Tebaida , de Gherardo Starnina, na Galeria dos Uffizi, em Florença. Um quadro, que alguns atribuem a Paolo Ucello ou a Fra Angelico. “À força de as observares, algumas destas
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Costumo dizer que há cidades de que se gosta. Do Porto aprende-se a gostar. E, normalmente, a primeira impressão é repelente. É uma cidade mal humorada, difícil, de acesso restrito e caprichosa. Os curiosos de passagem são afastados pelo hálito, pelo sotaque forte e pela cor da pele encardida de cinzento granítico das casas, monumentos, ruas e até das pessoas. Os que aprendem a cidade são recompensados de forma evolutiva. Todos os dias, na camuflagem do tempo, da geografia, da história e da personalidade o Porto premeia os interessados com paisagens, luzes, sombras, cores, névoas, formas, ilusões, miragens, aromas, sorrisos, seduções, descobertas, surpresas, mistérios e segredos. Por mais que se aprenda nunca se conhece o Porto. É um vício.
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À porta da Igreja das Antas, uma procissão de plátanos carrega a Primavera no esplendor do tapete verde. O caminho está aberto para a visita inesperada que o Inverno anda a fazer.

Tonight is blues

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Tonight is blues. Pendurada nos acordes do órgão electrónico, a voz negra, a fazer lembrar Tom Waits em noite de bebedeira, preenche a escuridão tingida de luzes coloridas das lâmpadas de presença e velas de sal espalhadas pelas mesas do Hotfive. Já passa da meia-noite. O primeiro andar está quase cheio de fumadores de conversa solta esmagados subitamente pelo swing típico dos blues. No piso de baixo a sala está bem composta. O baterista, Cenoura, já abandonou a mesa brincalhona e os dois amigos que foram obrigados a cheirar os eflúvios das peúgas, das palmilhas e até das solas das botas que colocou ao lado das bebidas. Instalado no meio da bateria, por entre esgares de louco, beijinhos às fãs imaginárias e malabarismos mal sucedidos com as baquetas, aguarda as instruções do líder da banda. Wolfram Minnemann mantém a cara de miúdo reguila com cinquenta anos, ou mais, bordada por um aro louro de cabelo adolescente e um sorriso desarmante, enquanto prime as teclas. O ritmo do blues vai-s

Câmaras de filmar nas salas de aula!

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A cena de violência entre uma aluna e a professora de francês na escola Carolina Michaëlis, no Porto, faz lembrar aqueles lances polémicos que a justiça desportiva decide punir depois de analisar as imagens televisivas. O facto de um colega da estudante ter gravado a cena e a ter colocado no You Tube provocou uma amplificação da gravidade do caso e obrigou a uma discussão generalizada sobre a falta de educação nos estabelecimentos escolares que em alguns casos chegam à agressão física. Do You Tube as imagens foram repescadas por um semanário e a seguir reproduzidas até à exaustão pelas cadeias de televisão. As reacções sucederam-se em catadupa desde as bases populares até às cúpulas dirigentes nacionais. Tal qual como nos lances polémicos do futebol: A agressão grave entre jogadores não é percepcionada pelo árbitro, o povo reclama justiça, os jornais e televisões exibem a prova e o tribunal futebolístico acaba por parir uma qualquer sentença que, por norma, costuma ser tão ou mais pol
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No momento em que o FC do Porto se sagrou vencedor virtual da Primeira Liga de futebol 2007/2008, encontrei, por acaso, estas duas fotografias de José Rocha, então a trabalhar no Público, que recordam a conquista do FC do Porto no campeonato de 1992/93. Lembro-me que, ao serviço da Rádio Nova, concebemos a cobertura jornalística de mais uma festa azul-e-branca a partir dos céus, num helicóptero alugado para o efeito. O estádio é o das Antas. Cheio como um ovo. A invasão de campo era a genuinidade natural da festa. Vitória de domingo à tarde, fecho de temporada, por 2-0 sobre o Marítimo e vitória final sobre o Benfica, primeiro dos últimos a apenas dois pontos. Futre, Rui Costa, João Pinto, Rui Águas, Paulo Sousa, treinados por Toni, não conseguiram impedir que os tripeiros comandados pelo brasileiro Carlos Alberto Silva renovassem a conquista do campeonato. No Porto jogavam Vítor Baia, Aloísio, Fernando Couto, Jorge Costa, Timofte, Rui Filipe, Jaime Magalhães, André, Paulinho Santos, D
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Pescador de Monte Gordo, Portugal, Junho de 2007 É conhecido por "o mudo". Emite uns sons guturais que assustam as crianças e tem uns jeitos bruscos que divertem os adultos. Riem-se dele. Gozam-no. Em tempos terá sido pescador. Agora ajuda a montar e a desmontar barracas de praia recebendo cervejas pelo trabalho ao sol. Dizem que é atrasado mental desde criança. E ele? Que pensará dos corpos disformes estendidos ao sol, da criançada irrequieta e barulhenta e dos desportistas de verão? Que confidências fará ao mar que lhe desenhou sulcos no rosto e lhe incrustou raízes na pele? Que imagens guardará por trás do olhar sumido? Que recordações remói enquanto levanta a âncora de uma embarcação que descansa na berma da água? Vestiu-se como se fosse à missa para acariciar as formas flutuantes, desentrançar as redes e limpar as escamas dos peixes coladas na barriga dos barcos. Oh mar! só tu me entendes no silêncio dos meus dias...

Ovos de Páscoa

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Um dia, numa capoeira, estavam duas galinhas chamadas Pascoínha e Pascoela. A certa altura, o dono das duas galinhas trouxe um sacalhão de açucar para a dieta delas. Quando elas se aproximaram para comer a Pascoínha e a Pascoela cairam dentro do saco. Depois, mais tarde quando o dono as tirou daquela porcaria as duas disseram: -Blarck! mas que porcaria; estamos todas brancas! - E a Pascoínha perguntou: -Engoli imenso açúcar e tu? -Eu também, temos de cacarejar ao nosso dono para nos dar outra dieta! - Disse a Pascoela. Então lá foram elas dizer (cacarejar) ao dono a historieta da dieta. O homem demorou muito, muito tempo a perceber o que elas lhe estavam a tentar comunicar mas lá conseguiu e concordou. No dia seguinte o homem trouxe-lhes como nova dieta chocolate e elas tornaram a cair e tornaram a dizer: -Que nojo, desta vez estamos todas castanhas e pegajosas! E a Pascoínha disse de novo: - Engoli metade do chocolate e tu? - Também eu! - disse a Pascoela! E assim nasceram os ovos de
A segunda guerra do Iraque começou há cinco anos. Para a História o 1 de Maio de 2003 ficou como o dia em que a guerra terminou, mas a verdade é que ela continua até hoje. Calcula-se que tenham morrido 160 mil pessoas. O alastramento da invasão norte-americana à frente norte, no Iraque, deve ter coincidido com a decisão de nos proporem a ida para a Turquia a fim de tentarmos entrar por aí para fazermos a cobertura jornalística da guerra. Estivémos na Turquia de 01 de Abril a 13 de Abril de 2003. Com o repórter de câmara Ricardo Ferreira, coadjuvados pelo guia curdo, tentámos de todos os modos chegar-nos o mais próximo possível dos locais onde havia operações militares. Numa primeira fase, a guerra (os militares turcos preocupados com o envolvimento dos curdos) não nos deixou entrar; na segunda, foi a direcção de informação da nossa estação televisiva que nos impediu de iludir as guardas de fronteira, num fundo falso de um camião que chegaria ao Norte do Iraque, atravessando por territó
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Foi preciso vir para a Turquia para começar a escrever no blog, criado há já um ano. Estou em Silopi, uma cidade no sudeste turco, mesmo à entrada do Norte do Iraque. Daqui já se vêem montanhas curdas. A Síria fica ali ao lado... O Irão um pouco mais à frente. Cheguei há uma semana e todas as tentativas de passar a fronteira foram goradas. Já centenas de jornalistas, de vários países, tentaram o mesmo, da mesma maneira e tiveram o mesmo resultado. Os que tentaram de outra forma foram detidos e expulsos da Turquia. Há aqui jornalistas a desesperar há um mês. Uma boa parte desistiu de Silopi e foi tentar para outro lado. Para além dos comboios de camiões de ajuda alimentar e reabastecimento que conseguem abrir caminho por entre a barreira militar turca pouco mais vejo desta guerra. Ou melhor, vejo o que todo o mundo vê. Na cidade de Silopi foi montado um pequeno centro de imprensa. Há três computadores ligados à internet e uma enorme televisão que debita emissões de mais de 200 canais de
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As estradas do Sudeste da Turquia estão sob um rigoroso controle militar . À medida que a fronteira de Habur se aproxima os "checkpoints" vão-se tornando mais frequentes. A maioria dos veículos passa, tendo apenas que abrandar. O nosso jipe é obrigado a parar. Sempre. A conversa com os militares só é possível através do guia curdo que fala turco e inglês. Recentemente, durante o longo tempo que leva a verificação dos documentos, soubemos finalmente a razão da nossa paragem obrigatória. O oficial explicou que os jornalistas estão proibidos de circular em determinadas zonas e não podem chegar perto da fronteira. Quem for apanhado a transgredir vai para uma lista negra e pode ser expulso. Mostrou-nos a lista. O nome de dois jornalistas portugueses estavam lá... Alfredo Leite do JN e José Manuel Rosendo da RDP. Senti orgulho.
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A guerra chegou ao princípio do fim mas a Turquia mantém a fronteira fechada aos jornalistas. Nada faço aqui e vou regressar a Portugal. No último dia em Silopi arrisquei uma visita a algumas das muitas aldeias vazias da montanha de Judi. A luta entre os militares turcos e os guerrilheiros do PKK levou Ancara a mandar evacuar as aldeias curdas encostadas à montanha... São dezenas e dezenas de lugares destruídos, com marcas de guerrilha nas paredes esburacadas, ainda de pé, e restos de conservas das rações militares turcas a enferrujarem pelo chão. A dado momento, numa dessas aldeias, o jovem guia curdo não conseguiu evitar a emoção: "Nem acredito que estou aqui... As coisas que eu ouvi contar sobre o que aqui aconteceu... Agora a guerra acabou. Oxalá não signifique para nós o início do sofrimento."

Que rica prenda!

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Esta crónica foi escrita 45 anos depois do meu nascimento. Às 21 e 45 minutos do dia 17 de Março de 1963 eu espreitei pela primeira vez este mundo e aceitei ficar por aqui a viver. Era domingo. Não me lembro rigorosamente de nada, mas confio no relato da testemunha principal desta ocorrência. Os meus pais estavam a passar o fim-de-semana em casa da minha avó materna, no Porto, ao fundo da rua de S. Vítor (nome de santo que eu acabaria por herdar), num local que a ponte de S. João se encarregou de destruir. Por essa altura o meu pai trabalhava nos caminhos-de-ferro, em Gouveia, na Beira-Alta, mas o fim do tempo de gravidez aconselhava proximidade da maternidade onde decidiram que eu seria dado à luz. As dores de parto anunciaram o nascimento durante toda a tarde desse domingo ensolarado de fim de inverno. Ao início da noite o meu pai chamou um táxi. Às 21 horas a cápsula materna transportada pela minha mãe chegou à maternidade de Júlio Dinis, no Porto. 45 minutos depois eu prescindi do

Príncipes das Astúrias

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Durante dois dias o Presidente da República Portuguesa visitou Leon onde foi distinguido com um doutoramento Honoris Causa. O ponto alto da visita foi o encontro com os Príncipes das Astúrias, Felipe e Letizia. Cavaco Silva e família não esconderam uma real vaidade por tão ilustre companhia. À saída do restaurante, em Leon, onde almoçaram todos, rodeados por uma rua cheia de seguranças e polícias, o povo foi-se aglomerando para ver de perto suas altezas reais. Para desespero dos guarda-costas os príncipes consentiram que o povo, alguns felizardos, tocasse na roupa e na pele que dá guarida ao sangue azul que lhes corre nas veias. Noutros tempos os súbditos teriam ajoelhado e beijado respeitosamente a mão das realezas. Agora tratam-nos como figuras de revistas cor-de-rosa que são: - Felipe, Felipe me da um beso… - Berrava uma matrona de telemóvel em punho. - Letizia, hola guapa… - “Piropeava” um jovem cabeludo de brinco na orelha e acne semeado na cara. Uma coisa é certa: os príncipes
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A Casa Botines de Gaudi em Leon (09.10.11 de Fevereiro de 2008)

A urgência da Anadia

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O povo de Anadia decidiu fazer uma maratona de protestos por causa do encerramento dos serviços de urgência do hospital local. Já contam dezoito manifestações. Para aí na décima quarta pediram a demissão do ministro Correia de Campos e o primeiro-ministro parece ter-lhes feito a vontade. E o que o povo queria mesmo era a reabertura da urgência… A concentração nº 18 aconteceu no passado domingo à tarde. Apareceram os do costume com os cartazes do costume escritos à pressa e à mão com alguns erros de português a pedirem palmatória (cuidado com o encerramento das escolas…). Durante duas horas algumas centenas de pessoas percorreram a pé uns cinco quilómetros da cidade num cortejo de críticas e um coro de cânticos de luta e esperança. O número de protestantes parece estar a diminuir. José Paixão, do movimento Unidos pela Saúde, não aceita que é o entusiasmo que se está a esvair. - Temos a concorrência de um funeral e o jogo de futebol do Anadia - Oliveira do Bairro. Só por isso é que a pra

Eternas enquanto duram…

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Kilimanjaro, 20.08.2006 O Monte Kilimanjaro, situado no Norte da Tanzânia, junto à fronteira com o Quénia, deve o seu nome à brancura e ao brilho das neves que foram classificadas de eternas, depositadas ao longo de 11 mil anos, num antigo vulcão. É o ponto mais alto de África com uma altitude de 5, 895 metros no Pico Uhuru. Mais dia menos dia o nome deixa de fazer sentido. O degelo é uma evidência. Em 1900 estimava-se que as neves tinham 12 quilómetros de extensão. Recentemente tinham apenas 2 quilómetros. Em 2005 a organização Climate Change distribuiu uma fotografia aos ministros da Energia e do Ambiente, que estavam reunidos em Londres para discutir as alterações climáticas, com o monte Kilimanjaro, pela primeira vez, despido de neve e gelo. Em Agosto de 2006 pude confirmar a tragédia. Tal como o amor as neves do Kilimanjaro também são eternas enquanto duram…