Que rica prenda!

Esta crónica foi escrita 45 anos depois do meu nascimento. Às 21 e 45 minutos do dia 17 de Março de 1963 eu espreitei pela primeira vez este mundo e aceitei ficar por aqui a viver. Era domingo. Não me lembro rigorosamente de nada, mas confio no relato da testemunha principal desta ocorrência.
Os meus pais estavam a passar o fim-de-semana em casa da minha avó materna, no Porto, ao fundo da rua de S. Vítor (nome de santo que eu acabaria por herdar), num local que a ponte de S. João se encarregou de destruir. Por essa altura o meu pai trabalhava nos caminhos-de-ferro, em Gouveia, na Beira-Alta, mas o fim do tempo de gravidez aconselhava proximidade da maternidade onde decidiram que eu seria dado à luz. As dores de parto anunciaram o nascimento durante toda a tarde desse domingo ensolarado de fim de inverno. Ao início da noite o meu pai chamou um táxi. Às 21 horas a cápsula materna transportada pela minha mãe chegou à maternidade de Júlio Dinis, no Porto. 45 minutos depois eu prescindi do aconchego uterino e fiz-me à vida.
Julga-se que terei retardado a saída a avaliar pela cor roxa que exibia e que obrigou as enfermeiras a tratamento especial. A minha mãe não me ouviu chorar e só me voltou a ver por volta da meia-noite quando já tinha recuperado a compostura e a cor natural de humano recém-nascido. Era gordo, careca e mamão. O parto foi natural, rápido e sem episódios especiais. Não dei trabalho.
Nasci poucos dias antes da comemoração do nono mês de casamento dos meus pais e na véspera da minha mãe completar 20 anos. Em 1963 os tempos portugueses eram de crise, de fome, pobreza e trabalho, mas as coincidências de datas e o casamento feliz justificavam plenamente o luxo que representava o pedido de uma prenda, reiterado com insistência: “Quando fizer 20 anos tens que me dar um prenda…”
O meu pai visitou-nos ao outro dia. Não regateou manifestações de alegria. Porém, não ficou obnubilado por esse rio de felicidade e deixou que a inteligência prática e o humor oportuno e refinado que o caracterizava viessem à tona, enquanto me abraçava pela primeira vez:
- Querias uma prenda nos teus 20 anos… Aqui a tens!

Comentários

Anónimo disse…
Obrigada pelo presente.

Fantastico!
Anónimo disse…
Parabéns um pouquito atrasados, a tua foto é inconfundível,que pequenino tão giro. A minha irmã, que tu tb conheces, faz anos no mm dia que tu e tb nasceu no mesmo sitio. Parabéns mais uma vez.
Bj gde.

Cristina
Olá

já chego tarde, mas ainda assim aqui ficam os parabéns.
Estás giro na foto!
Bjs.,
Sónia Neves disse…
Olá!

Os meus parabéns ainda que atrasados! Gostei de ler a sua história de vida escrita da forma confundível a que já nos habitou e com uma singularidade inconfundiveis!

Parabens!
Cumprimentos,
Sónia Neves
Elisabete Silva disse…
...de todos, sem duvida o mais diferente...claro, a tua historia!...não de vida mas como tudo começou para "tal":):):)!... Apesar de atrasados, os meus parabéns, não só pelos teus 45 anos de idade mas pela pessoa que és;)

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